quinta-feira, 22 de julho de 2010

Um deus chamado dinheiro

Fazemos parte de uma sociedade capitalista, logo, muitas pessoas ao longo da caminhada estão formando a sua identidade a partir deste paradigma. Como bem observou Cora Coralina: “O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada”. E, é na caminhada, que duas coisas podem surgir: Ou vou me tornar uma pessoa madura e feliz, ou então, uma pessoa cheia de fel e infeliz.

Sabemos que o dinheiro faz parte da nossa vida, pois precisamos dele para suprir as nossas necessidades. Contudo, quando o ser humano se torna devoto (ação ou resultado de devotar-se, de dedicar-se a alguém ou a algo, forte sentimento de veneração, de admiração, de amor) do dinheiro, as pessoas são capazes de tudo. Por exemplo: matar, espoliar o próximo, defraudar, roubar, cometer perjúrio para se beneficiar, passar por cima de outras pessoas, corromperem-se abrindo mão dos seus valores.

No livro Dinheiro, sexo e poder, Richard J. Foster faz a seguinte observação: “(...) o amante do dinheiro fará qualquer coisa por ele. E é precisamente aí que reside seu aspecto sedutor; para a pessoa que ama o dinheiro, meias medidas não bastam. A pessoa é fisgada. O dinheiro se torna um problema que consome e domina a vida. É um deus que exige devoção total” e Francis Bacon caminha na mesma direção salientando: “ Se o dinheiro não é seu servo, será seu mestre”.

A pessoa que é dominada pelo dinheiro elimina qualquer tipo de moderação no que diz respeito ao uso do mesmo. Em nossa sociedade, o dinheiro torna-se símbolo de poder, status e influência. Logo, para demonstrar que “possui” poder, status e influência, o ser humano adquiri bens e serviços e isso gera nele o fator insaciabilidade.

Por outro lado, esse tipo de postura, acaba encontrando espaço na vida das pessoas onde a valorização já não é mais pelo que você é como ser humano, e sim pelo que você possui. Como bem descreveu o Frei Beto: “Se chego à casa de um amigo de ônibus, meu valor é inferior ao de quem chega de BMW. Isso vale para a camisa que visto ou para o relógio que trago no pulso. Não sou eu, pessoa humana, que faço uso do objeto. É o produto revestido de fetiche que me imprime valor, aumentando a minha cotação no mercado das relações sociais.”

Frei Beto chama a atenção exatamente para aquilo que está acontecendo na atualidade, ou seja, a coisificação da vida humana. Valoriza-se o ter em detrimento do ser.

Gostaria de destacar algumas coisas que Jesus disse acerca do mesmo e que podemos utilizar para não sermos dominados por esse deus que pede nossa devoção. Assim, expressou Jesus:

Ninguém pode servir a dois senhores; pois odiará um e amará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro. Mateus 6:24

Jesus ao proferir essas palavras estabelece as seguintes premissas:

(1) Não deixe que os recursos materiais se tornem senhores de nossas vidas e alvo de nossa devoção. Ou nas palavras de Dietrich Bonhoeffer (Apud: Richard Foster): “Nosso coração apenas tem lugar para uma devoção total, e somente podemos agarrar-nos a um Senhor.”

(2) Aquele que é devoto do dinheiro não terá tempo para Deus. Quantas pessoas não têm “tempo” para pensar nos propósitos de Deus para a sua vida porque estão preocupadas em ganhar mais e mais e, para isto, muitas vezes sacrificando a própria família. Para aqueles que amam o dinheiro cabe bem a observação feita pelo Richard Foster: “(...) para a pessoa que ama o dinheiro não há meio-termo. Ela está fisgada. O dinheiro torna-se um problema que consome e domina a vida. É um deus que exige devoção total.”

Não existe meio termo, ou amamos a Deus ou ao dinheiro. Não tem nenhum problema você possuir bens, entretanto, quando este passa a ser objeto da sua veneração, aí sim, existe problema; como bem disse o apóstolo Paulo: “Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores.” 1 Timóteo 6:10

É por causa do amor a este deus (dinheiro), que há muitas desigualdades, mortes, roubos, corrupções, famílias dilaceradas, relacionamentos falidos.

Que Deus nos ajude a sermos senhores do dinheiro e não servos dele !!

Pr. Fernando Gonçalves Dias

sexta-feira, 16 de julho de 2010

A igreja nos dias atuais – uma avaliação crítica.

O presente artigo tem como objetivo avaliar de maneira crítica a relação da igreja com a sua missão de propagar o reino de Deus e os seus valores, contrastando com os valores vigentes em nossa sociedade. Como discípulos de Cristo, fomos chamados para o grande projeto do reino de Deus. Todavia, ao olharmos para os valores da sociedade e a ação da igreja, duas perguntas emergem: (1) Quais são os valores comunicados pela sociedade?; (2) Como igreja, estamos sendo aquilo para o qual fomos chamados e enviados ou estamos sendo plasmados pelos valores da sociedade?.

É fato, que ao passar dos anos, transformações foram surgindo nos indivíduos, nas famílias e consequentemente na sociedade, porém, isso não significa necessariamente que as pessoas estejam mais humanas, felizes e solidárias. Pelo contrário, ao olharmos a nossa volta percebe-se na sociedade um misto de: individualismo, hedonismo, narcisismo, imediatismo, valorização do ter em detrimento do ser, relativismo, permissivismo, consumismo, niilismo, falta de compromisso, valorização exacerbada das emoções.

Pelas descrições da sociedade acima, o sociólogo Cláudio Antônio Cardoso Leite e o historiador Fernando Antônio Cardoso Leite chegaram à seguinte conclusão: “Qualquer evangélico, minimamente informado, perceberá que as transformações recentes que o meio evangélico tem vivenciado guardam paralelos intrigantes com os caminhos da sociedade contemporânea, como um todo.”

Ao refletirmos sobre os valores preconizados pela sociedade e como discípulos inseridos na mesma, duas coisas podem acontecer: ou influenciamos ou somos influenciados. É perceptível na atualidade que muitas igrejas estão reverberando os conceitos chamados de pós-modernos em suas vidas, o que consequentemente inviabiliza a eficácia da sua missão. Vejamos alguns dos valores ensinados na sociedade e vivenciados pela mesma, que encontram eco na igreja de Cristo:

Individualismo – Esse “eco” está cada vez mais enraizado nas comunidades evangélicas uma vez que a dor do outro não me impacta, a fome do outro não me diz respeito, a solidão da massa não é problema meu. Expressão do tipo: “(...) chorai com os que choram. Rm 12:15” está cada vez mais escassa na vida daqueles que foram chamados de “sal da terra” e “luz do mundo”.

Consumismo – Uma das coisas que o cliente não é: fiel a determinadas marcas. O consumidor busca muitas vezes preço e satisfação pessoal, por exemplo: se eu levo o produto A e amanhã o produto B está mais em conta, eu levo o produto B. Ao refletirmos sobre aqueles que frequentam as nossas igrejas e aqueles que compõem a mesma, nota-se um paralelo muito grande do consumidor de bens e serviços com aqueles que são consumidores espirituais. São pessoas que estão ali para consumir tudo que está a sua volta e se esquecem do que foi dito por Jesus: “Porque o Filho do homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos”. Está se multiplicando aqueles que não querem mais ser servos, com isto, esquecem que tudo o que fazemos é para Deus e não para nós, é para agradar a Deus e não a nós. Concordo com as palavras do pastor Ed René: “A conversão já não implica transformação (...). (...) a legitimidade da conversão está vinculada à satisfação do cliente. Convertido não é aquele que se tornou nova criatura, mas aquele para quem Deus funciona, em que “funcionar” equivale a “abençoar”.”

Imediatismo – Essa característica está presente nas relações empresariais, onde o resultado tem de ser para “ontem”. Intrigante como este pensamento contemporâneo, perpassa a vida da igreja. A igreja boa e triunfante é aquela que cresce vertiginosamente em número, a pergunta de irmãos que se encontram é a seguinte: Quantos membros têm a sua igreja?. Logo, observa-se uma ênfase muito grande na quantidade sem, muitas vezes, se ater à qualidade, que deve ser fruto de corações transformados pela graça e que, uma vez transformados por essa graça, se tornam discípulos de Jesus. Diante deste fenômeno corrente nos dias atuais, Luís Augusto Corrêa Bueno faz a seguinte observação: “Ao decorrer de meus anos de ministério pastoral e atualmente como professor e diretor de uma escola de treinamento missionário, sou levado a pensar que o momento da igreja brasileira em sua geração é por demais delicado. Isso porque, vemos as igrejas locais procurando ansiosamente meios de crescimento numérico, muitas delas, sinceramente, buscando cumprir o mandato de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas que em sua caminhada, tem abandonado princípios inegociáveis da Escritura Sagrada, resultando em uma situação de “stress” espiritual para a comunidade, a diluição da fé e o enfraquecimento qualitativo e orgânico dos crentes.”
Assim, para Luís Augusto Corrêa Bueno, a igreja tem abandonado princípios inalienáveis da Escritura Sagrada para poder crescer sem se ater também na qualidade. Isso, consequentemente, concorre para um enfraquecimento na qualidade e na espiritualidade.

Emocionalismo – Neste modelo o que chama a atenção é o fato de que se procura uma série de sensações novas e excitantes. Nas igrejas, muitas vezes o que caracteriza se o culto foi “bom” ou não, são as sensações novas que o mesmo produz naqueles que se dizem discípulos e quantos choros ele produziu nas pessoas (não quero dizer com isto que você não pode se emocionar na presença de Deus, o foco não é este). O que está inserido no emocionalismo é o prazer e a satisfação que o mesmo me propicia. Logo, intimidade com Deus está resumida a sensações emotivas. No entanto, quando a ênfase recai no emocional, este modelo cria pessoas imaturas espiritualmente que não conseguem entender, por exemplo, que as dificuldades fazem parte da vida. São pessoas que não “aceitam” passar por determinadas situações e logo ficam frustradas com Deus tendo em vista a sua imaturidade. Em relação a este aspecto, assim ponderou o pastor Ed René: “A experiência espiritual moderna, ou pós-moderna, como preferem alguns, é na verdade, medieval. Primeiro porque vê Deus como um meio e não como um fim em si mesmo. Deus passou a estar a serviço do fiel, responsável por realizar seus desejos, sob pena de ser abandonado e considerado um Deus ausente, distante, omisso e lento demais para suprir as demandas dos desafios da vida.”

Quando a igreja vive de maneira acrítica aos valores mencionados acima, ela se corrompe e passa a viver conforme os ditames da mesma. Se quisermos que a igreja seja relevante e atuante, precisamos viver como “sal” e “luz”. Hoje, mais do que nunca, as palavras do apóstolo Paulo se fazem necessárias: “E não vos conformeis com este século....”.
Como igreja que expande o reino de Deus, precisamos contextualizar a mensagem deixada por Cristo, porém, sem se contemporizar.
Pr. Fernando G. Dias