segunda-feira, 1 de março de 2010

Rubião e a Sociedade Contemporânea.

Machado de Assis escreveu um livro chamado Quincas Borba, no qual percebe-se a visão do autor, cuja percepção da vida era – pessimista e niilista. Nesta obra existe um personagem chamado Rubião, mineiro de Barbacena, que herda todos os bens do Quincas Borba e é deste personagem que extrair-se-á ensinamentos para reflexão.

Quincas Borba ensinou uma “doutrina” para Rubião na qual a celebre frase – Ao vencedor as batatas! ficou cravada na mente deste mineiro. Depois de muito ser explorado e espoliado em sua vida, Rubião adoeceu. Ele, mesmo doente, faz uma análise da vida e chega a seguinte conclusão:

Ao vencedor , as batatas! – bradava Rubião aos curiosos.
Ao vencedor , as batatas! – concluiu rindo.
Poucos dias depois morreu...Não morreu súdito nem vencido.

Essa frase contundente nos lábios de Rubião trás em seu bojo a vitória do mais forte sobre o mais fraco e reflete bem o pensamento contemporâneo - manda quem pode, obedece quem tem juízo. No entanto, gostaria de refletir com você sobre algumas coisas que eu aprendi com este personagem e o real interesse das pessoas que o rodeava. Pelo menos três coisas ficaram patentes na vida de Rubião e dos seus pseudos amigos, a saber:

• A banalização da vida – Enquanto Rubião possuía riquezas, era tratado com fidalguia, principalmente pelo esposo de Sofia, Cristiano. Quando ele adoeceu e ficou pobre devido as explorações, perdeu seus “amigos”. Na nossa sociedade parece que as coisas funcionam da mesma maneira, ou seja, você é benquisto dependendo do que você possui. É a valorização do ter em detrimento do ser e assim o ser humano vai banalizando a vida. Quanto a esta questão cabe bem a reflexão feita pelo Jornalista Leon Frejda Szklarowsky:
"Quando a vida humana, bem mais precioso entre todos os demais, nada mais vale, é sinal de que o homem deve parar e fazer profunda reflexão, porque chegou ao fundo do abismo e há que se repensar o sentido de todas as coisas!”


• A fragmentação dos valores – Rubião apaixonou-se por Sofia e chegou a se declarar para a moça que revelou para seu esposo o que ele fizera (ela não era a santa que queria passar para seu esposo). Cristiano não se importou uma vez que ele tinha outras pretensões com Rubião, os interesses pessoais estavam acima da moral e dos valores. Parece que falar de valores em uma sociedade, individualista, narcisista, hedonista é utopia. Vivemos em uma sociedade na qual a individualidade é que vale, se algo me dá prazer isto basta, se prejudicar o próximo não é problema meu. Vivemos em uma sociedade permissiva, onde o lema tem sido – cada um pensa o que quer e faz o que quer desde que respeite o espaço alheio. O resultado dessa equação é a ausência cada vez maior de valores que venham corroborar com a juventude e a sociedade como um todo. Tem faltado em nossa sociedade significado e propósito de vida e conseqüentemente mais e mais os valores estão sendo fragmentados.

• O triunfo da maldade – Essa é a visão de Quincas Borba e Rubião, o mal sempre vence e tudo que acontece na vida são sucessões de coisas que já aconteceram e que tornam a acontecer (visão cíclica) e quando olhamos para a sociedade e as mazelas que nos cercam somos muitas vezes tentados a pensar como os personagens. Contudo, cai bem as palavras do historiador Jean Delumeau (apud Ed René) que diz o seguinte:


"O mal certamente existe. Mas o bem também. O belo existe. A ternura existe. Todos podem constatar isso cotidianamente. Não fazer entrar a realidade do bem em uma análise da condição humana é cometer uma subtração ilegítima (...) Com os meios modernos de destruição pode-se hoje aniquilar em dois minutos uma cidade cuja construção e extensão haviam exigido dois mil anos de esforços. Contrariamente ao mal, o bem não faz barulho. Essa 'discrição' faz com que não o levemos suficientemente em consideração em nosso juízo sobre o mundo. 'Ouve-se o estrondo da árvore que é derrubada, mas não se ouve a floresta que cresce', diz o provérbio. A floresta que cresce silenciosamente é o bem que é realizado a cada dia na Terra, em torno de nós e também - por que não? - por nós (...) Suponha que, de repente, o voluntariado deixasse de existir, que subitamente ninguém mais viesse a ajudar ninguém... com isso a existência cotidiana ficaria paralisada e a vida se tornaria insustentável. A humilde generosidade de cada dia está na própria base do tecido social. Mas ela não atrai a atenção das mídias. Estamos tão acostumados com ela que não a percebemos. Em compensação, seu desaparecimento repentino criaria um vazio impossível de ser preenchido."


Diante do quadro sombrio retratado na obra Machadiana e respaldado pelas cenas vistas na sociedade como um todo, restam-nos algumas perguntas: Existe ainda um modo de pensar, um padrão de comportamento, um momento nas relações capaz de constituir um terreno comum sobre o qual possamos fundar uma confiança recíproca? Será que os valores estão tão desfragmentados que os outros serão apenas uma ameaça ou, pelo contrário, sujeitos com os quais temos o dever de conviver e cooperar? O que prevalece, o medo ou a confiança.
Para tais perguntas creio que somente à luz de Deus, as realidades humanas adquirem seu significado profundo e completo.

Pr. Fernando Gonçalves Dias

7 comentários:

Anônimo disse...

Li todo o texto e digo Amém!

Gosto muito sobre este tema em que você está se especializando. Penso até em seguir pelo mesmo caminho. Não podemos ser reféns desta sociedade. Não nos conformeis com este século diz as Escrituras.

Se não vigiamos ficará difícil de termos o sinal diferenciador entre Igreja e sociedade secularizada e pós-moderna.

Continue escrevendo para reflexão e amadurecimento...

Pelo que vi este texto vai ter parte II: Para tais perguntas creio que somente à luz de Deus, as realidades humanas adquirem seu significado profundo e completo.

Abraço!
Rev. Hebert Quaresma.
Vulgo: Rev. Hebinho.

Anônimo disse...

Olá pastor ! Td bem ?

Adorei seu post, que Deus abençoe

Anônimo disse...

Rev Fernando
Gostei muito do texto. Retrata bem nossa sociedade atual, onde o ter vale mais que o ser. Que Deus o ilumine e que possamos contar sempre com suas reflexões.
Abraços
Cristina

Anônimo disse...

Rev Fernando,

Gostei da mensagem passada e que retrata bem esta sociedade que estamos inseridos. O texto evidencia quão distantes as pessoas estão de Deus.

Um gde abraço,
Cristiano

Anônimo disse...

Saúde e Paz Rev Fernando... muito bom... parabéns.
Continue sendo esta bênção que tem sido... acha que chegou a hora de nós pastores vivenciarmos essa realidade... Tem um livro muito bom do Rev Hernandes D. Lopes sobre esse assunto em relação a pastor: "de pastor pra pastor".(Hagnos).
Que o Espírito Santo continue lhe usando poderosamente.

Rev Weliton Vitorino.

Blog da Profa. Rosilma disse...

Li os seus artigos, esta reflexão relamente vem de encontro com o que esta acontecendo com as relações familiares, a cada dia ficamos mais distantes dos nossos filhos, dos nossos pais, dos nossos irmãos, dos nossos amigos e muitas vezes distante de nós mesmos, temos que parar e refletirmos no que queremos para nós.....

Rosilma

Anônimo disse...

Olá meu amigo,

Que DEUS continue iluminando o seu caminho e os seus pensamentos também.

Um grande abraço do seu amigo

Douglas